Caso Clínico: Demência por Corpos de Lewy (DCL) e o Tratamento com Cannabis

Publicado em 15/10/25 | Atualizado em 15/10/25 Leitura: 7 minutos

Canabinoidescaso clínicoNeurológicas

Identificação

Paciente do sexo feminino, 76 anos de idade.

Apresentação do caso clínico

A paciente foi trazida para avaliação com um diagnóstico de Demência por Corpos de Lewy (DCL) em estágio avançado. O quadro clínico se apresentava com um comprometimento cognitivo global e significativo, caracterizado por amnésia grave, afasia expressiva (com ausência de verbalização), e uma marcante apraxia, evidenciada pela imobilidade funcional e pela dependência total para as atividades de vida diária.

A queixa principal, no entanto, era a presença de espasmos mioclônicos de alta intensidade, que afetavam os membros superiores e inferiores, comprometendo ainda mais sua pouca autonomia e gerando angústia e preocupação considerável aos cuidadores. Além disso, a família relatou um quadro de insônia crônica, que contribuía para a irritabilidade e o cansaço diurno da paciente. A paciente também apresentava frequentes equimoses e púrpuras em braços e pernas, sugerindo uma fragilidade capilar exacerbada. O controle motor estava progressivamente deteriorado, com sinais de rigidez e instabilidade postural, o que impedia qualquer tentativa de deambulação sem auxílio.

Paciente com comprometimento cognitivo
Paciente com comprometimento cognitivo

Medicamentos em uso

A paciente fazia uso contínuo de diversas medicações, incluindo:

  • Hidantal
  • Losartana
  • AAS
  • Amitriptilina
  • Memantina

 

Diante da falha dos tratamentos convencionais em controlar os sintomas e das comorbidades da paciente, optou-se por uma terapia adjuvante com canabinoides.

Exame Físico

BEG, eupneica, normocorada.

SSVV: PA, FC, FR e Tax estáveis e dentro da normalidade.

Pele: Pele com presença de equimoses e púrpuras difusas em membros superiores e inferiores. Mucosas coradas e hidratadas.

CP: Crânio normocéfalo. Pescoço simétrico, sem adenomegalias ou tireoide aumentada.

AR: Tórax simétrico, com expansibilidade pulmonar preservada. MV bilateralmente audível, sem RA. 

ACV: Bulhas rítmicas, BNF, em 2T, sem sopros. Pulsos periféricos presentes e simétricos.

ABD: Plano, flácido, indolor à palpação. RHA presentes, sem massas, visceromegalias ou sinais de irritação peritoneal.

EXT: MMSS e MMII simétricos, sem edemas, com presença de espasmos mioclônicos.

SN: O exame neurológico evidenciou um comprometimento grave, com afasia expressiva e apraxia, resultando em imobilidade funcional. A paciente não conseguia verbalizar ou realizar movimentos voluntários complexos. Reflexos tendinosos profundos estavam preservados, mas a rigidez e a instabilidade postural comprometiam a marcha, que era auxiliada e irregular. O exame de força e sensibilidade não foi totalmente avaliável devido à falta de colaboração.

Lista de Problemas

  • P1- Demência por Corpos de Lewy (Estágio Avançado)
  • P2 – Espasmos Mioclônicos
  • P3 – Equimoses e púrpuras difusas
  • P4 – Insônia 
  • P5 – Polifarmácia

Plano Terapêutico

Tratamento com Cannabis

Devido à refratariedade do quadro aos tratamentos convencionais e à necessidade de manejar os espasmos mioclônicos e a rigidez, foi proposto um plano terapêutico com canabinoides.

Proposta terapêutica inicial

A estratégia foi focar no controle dos sintomas motores e na melhora da qualidade de vida, utilizando o potencial anti-inflamatório, analgésico, relaxante muscular e indutor do sono dos derivados canabinoides.

Abordagem Farmacológica:

A abordagem farmacológica consistiu na prescrição de um óleo de cannabis de espectro completo, com uma proporção de 15:1 CBD:THC. Essa escolha foi feita para aproveitar a potente ação anticonvulsivante e neuroprotetora do CBD, minimizando potenciais efeitos psicotrópicos do THC. A posologia inicial foi de 7 gotas, três vezes ao dia (manhã, tarde e noite), totalizando cerca de 35 mg de CBD + 2mg THC diariamente. A família foi orientada a manter todas as medicações em uso e a não realizar suspensões por conta própria. 

Abordagem não-farmacológica:

A abordagem não-farmacológica incluiu a continuidade da fisioterapia e a suplementação com ômega 3 (2.000 mg/dia), magnésio (280 mg/dia), complexo B e vitamina D (2.000 UI/dia), além de orientações para uma dieta menos industrializada.

Acompanhamento e Ajustes

Primeira Reavaliação (Três meses após o início)

A paciente apresentou uma melhora notável e inesperada em vários aspectos do quadro. Os espasmos mioclônicos desapareceram completamente, o controle motor melhorou, permitindo que ela se levantasse sozinha, e houve um aumento da verbalização e do humor. O sono, no entanto, ainda se mostrava irregular.

A família relatou ter suspendido todas as medicações convencionais, exceto o AAS, por conta própria, após perceberem a melhora.

Diante disso, um ajuste no tratamento foi necessário: a dose de CBD da noite foi suspensa e substituída por um óleo equilibrado com 10 mg/ml de CBD e 6 mg/ml de THC, visando melhorar a qualidade do sono. A nova posologia foi de 4 gotas à noite, com titulação até um máximo de 10 gotas.

Evolução do Tratamento (Após nove meses)

A terceira consulta confirmou a estabilidade do quadro. A paciente continua a dormir melhor (cerca de 7 horas por noite), os espasmos musculares estão quase ausentes e o humor se mantém bom. Embora a memória e a fala não tenham se recuperado significativamente, a qualidade de vida geral melhorou de forma substancial. A paciente se manteve mais ativa e com menos sofrimento, trazendo um grande alívio para a família e demonstrando a eficácia dessa abordagem no dia a dia. As doses dos óleos de cannabis foram mantidas, e a paciente continuou em uso apenas do AAS e das formulações canabinoides.

Paciente dividindo momentos de felicidade com sua família. Após melhora do quadro com o tratamento realizado com cannabis medicinal
Paciente dividindo momentos de felicidade com sua família. Após melhora do quadro com o tratamento realizado com cannabis medicinal

Conclusão

Este caso clínico destaca a notável eficácia da terapia com canabinoides como uma abordagem complementar no manejo da Demência por Corpos de Lewy (DCL) em estágio avançado. Embora não se espere a reversão do quadro neurodegenerativo principal, a terapia se mostrou extremamente bem-sucedida no controle de sintomas de alta morbidade, como os espasmos mioclônicos e a insônia crônica, que impactavam diretamente a qualidade de vida da paciente.

A melhora significativa nos sintomas motores e na qualidade do sono não apenas proporcionou maior conforto e dignidade à paciente, mas também gerou um alívio substancial para os cuidadores e para o ambiente familiar. A redução do sofrimento do paciente refletiu-se em um ambiente mais sereno e menos estressante para todos.

O caso reforça o potencial do uso de canabinoides como uma alternativa terapêutica segura e eficaz, especialmente quando tratamentos convencionais falham, evidenciando a importância de uma abordagem clínica integrativa e centrada no bem-estar global do paciente.

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