Como os canabinoides podem ajudar na oleosidade da pele?

Publicado em 05/06/25 | Atualizado em 02/06/25 Leitura: 13 minutos

CanabinoidesDermatológicas

A busca por soluções inovadoras no tratamento de problemas dermatológicos tem levado pesquisadores a explorarem cada vez mais o potencial dos canabinoides. Entre as diversas propriedades estudadas, seu impacto no controle da oleosidade da pele tem despertado especial interesse no campo da dermatologia contemporânea.

Os canabinoides, compostos encontrados na planta Cannabis sativa, têm demonstrado resultados promissores em diversos estudos científicos relacionados ao tratamento de condições cutâneas. Neste post, mergulharemos profundamente na compreensão de como esses compostos podem atuar no equilíbrio da produção sebácea e no manejo da oleosidade da pele.

Oleosidade da pele

A oleosidade da pele é um processo fisiológico fascinante e complexo que vai muito além da simples produção de sebo. Trata-se de um mecanismo complexo de defesa e proteção cutânea que desempenha um papel fundamental na saúde e no funcionamento do maior órgão do corpo humano.

As glândulas sebáceas são estruturas microscópicas distribuídas estrategicamente pela pele humana, com concentração mais significativa em determinadas regiões como rosto, tórax superior, costas e atrás das orelhas. Compostas principalmente por células denominadas sebócitos, essas glândulas realizam um processo de secreção conhecido como holócrino, no qual as células literalmente se desintegram para liberar o sebo.¹

O sebo, um fluido viscoso e complexo, é composto por uma mistura fascinante de substâncias, incluindo esqualeno, ésteres de cera, triglicerídeos, ácidos graxos livres, ésteres de colesterol e esteróis livres. Longe de ser apenas um problema estético, esse composto desempenha funções cruciais de proteção e hidratação da pele.¹

A produção de sebo não é um processo estático, mas sim dinâmico e fortemente influenciado por diversos fatores ao longo da vida. No nascimento, as glândulas sebáceas já estão presentes e inicialmente apresentam alta atividade. Após um período de redução, a produção aumenta drasticamente durante a puberdade, impulsionada principalmente por hormônios andrógenos.¹

Os níveis hormonais têm um papel fundamental nesse processo. A 5α-diidrotestosterona (DHT) destaca-se como o principal modulador da diferenciação e proliferação das glândulas sebáceas. Essa dinâmica hormonal explica por que homens tendem a ter pele mais oleosa e por que mulheres experimentam variações na oleosidade durante ciclos menstruais e fases hormonais específicas.¹

Múltiplos fatores contribuem para a variabilidade da produção sebácea:

Fatores Hormonais

  • Níveis de andrógenos
  • Ciclo menstrual
  • Gravidez
  • Menopausa

Fatores Ambientais

  • Clima (temperatura e umidade)
  • Estação do ano
  • Exposição solar
  • Poluição

Fatores Genéticos

  • Predisposição racial
  • Herança familiar
  • Características étnicas específicas

Estudos revelam interessantes variações raciais na produção sebácea. Mulheres chinesas, por exemplo, tendem a apresentar poros menores e menor densidade, enquanto indivíduos afro-americanos frequentemente exibem poros mais pronunciados e maior produção de sebo.¹

Contrariamente à percepção negativa, as glândulas sebáceas desempenham funções vitais:

  1. Proteção da Barreira Cutânea: Criação de um filme protetor que impede a entrada de patógenos
  2. Hidratação: Manutenção da flexibilidade e umidade da pele
  3. Imunidade Inata: Contribuição para os mecanismos de defesa cutâneos
  4. Regulação Térmica: Auxílio no controle da temperatura corporal

A compreensão detalhada da oleosidade da pele é fundamental para o diagnóstico e tratamento de diversas condições dermatológicas, como:

  • Acne
  • Dermatite seborreica
  • Rosácea
  • Distúrbios de produção sebácea

A oleosidade da pele representa um complexo sistema de regulação biológica, influenciado por fatores genéticos, hormonais, ambientais e individuais. Longe de ser apenas um problema estético, trata-se de um mecanismo de defesa essencial para a saúde cutânea.

Compreender essa complexidade permite abordagens mais precisas e personalizadas no cuidado dermatológico, superando visões simplistas e promovendo uma gestão mais eficaz da saúde da pele.

O Sistema endocanabinoide e o controle da oleosidade

O Sistema Endocanabinoide (SEC) é uma rede biológica complexa composta por receptores, endocanabinoides e enzimas responsáveis por sua síntese e degradação. Presente em diversos tecidos do organismo, incluindo o sistema nervoso, imunológico e a pele, o SEC desempenha um papel essencial na regulação da homeostase celular. Sua principal função é manter o equilíbrio fisiológico por meio da modulação de processos como inflamação, dor, metabolismo lipídico e resposta imunológica. Na pele, o SEC atua diretamente sobre as glândulas sebáceas, queratinócitos e fibroblastos, influenciando a produção sebácea, a renovação celular e a resposta inflamatória.²

O Sistema Endocanabinoide representa uma das descobertas mais fascinantes no campo da dermatologia contemporânea, oferecendo uma compreensão revolucionária sobre os mecanismos de controle da saúde cutânea. Longe de ser um simples sistema de sinalização, trata-se de um complexo mecanismo molecular que desempenha um papel fundamental na homeostase da pele, especialmente no controle da oleosidade e nos processos inflamatórios.²

A complexidade desse sistema reside na interação entre receptores canabinoides, principalmente CB1 e CB2, que estão expressivamente presentes nas glândulas sebáceas humanas. Essa descoberta científica abre horizontes terapêuticos inovadores para o tratamento de condições dermatológicas como acne e seborreia. Os receptores não são apenas elementos passivos, mas verdadeiros protagonistas na regulação das funções cutâneas.³

A interação molecular entre canabinoides e sebócitos revela-se surpreendentemente sofisticada. Endocanabinoides como anandamida (AEA) e 2-araquidonilglicerol (2-AG) demonstram capacidades únicas de modulação celular. Eles são capazes de induzir a produção de lipídios de forma dose-dependente, com mediação primária através do receptor CB2, e podem até estimular processos de apoptose seletiva em sebócitos.³

Diferentes canabinoides apresentam perfis de ação distintos e complementares. O canabicromeno (CBC) e a tetrahidrocanabivarina (THCV), por exemplo, atuam na supressão da lipogênese, enquanto o canabidiol (CBD) inibe a produção sebácea por meio de mecanismos específicos, como a ativação do canal iônico TRPV4. Já o cannabigerol (CBG) se destaca por suas pronunciadas propriedades anti-inflamatórias.³

Os mecanismos de ação molecular são impressionantes. Os canabinoides atuam através de múltiplas vias de sinalização, incluindo a inibição da via MAPK/ERK, a regulação das vias NF-κB e a modulação das vias AMPK e AKT/FoxO1. Essa multiplicidade de ações permite uma abordagem terapêutica multifacetada e direcionada.³

Mecanismo de ação dos canabinoides na acne e seborreia Os endocanabinoides aumentam a síntese lipídica e a apoptose dos sebócitos por meio da CB2R A ação lipostática do CBD é mediada pelo canal iônico TRPV4 através da inibição da via MAPK/Erk. Um extrato hexânico de semente de cânhamo inibiu a via NF-κB e MAPK em queratinócitos e regulou a produção de lipídios via sinalização AMPK e AKT/FoxO1 em sebócitos. CBD: canabidiol; TRPV: vanilóide potencial receptor transitório; MAPK/Erk: proteína quinase ativada por mitógeno/quinase regulada por sinal extracelular 1/2; AMPK: proteína quinase ativada por AMP; mTOR: mamífero alvo da rapamicina; FoxO1: Proteína O1 da caixa Forkhead. Fonte: Biorender at www.biorender.com 
Mecanismo de ação dos canabinoides na acne e seborreia Os endocanabinoides aumentam a síntese lipídica e a apoptose dos sebócitos por meio da CB2R A ação lipostática do CBD é mediada pelo canal iônico TRPV4 através da inibição da via MAPK/Erk. Um extrato hexânico de semente de cânhamo inibiu a via NF-κB e MAPK em queratinócitos e regulou a produção de lipídios via sinalização AMPK e AKT/FoxO1 em sebócitos. CBD: canabidiol; TRPV: vanilóide potencial receptor transitório; MAPK/Erk: proteína quinase ativada por mitógeno/quinase regulada por sinal extracelular 1/2; AMPK: proteína quinase ativada por AMP; mTOR: mamífero alvo da rapamicina; FoxO1: Proteína O1 da caixa Forkhead. Fonte: Biorender at www.biorender.com

Além do controle sebáceo, os canabinoides demonstram um potencial antimicrobiano inovador. Pesquisas comprovam sua eficácia contra o Cutibacterium acnes, principal bactéria associada à acne. Os resultados científicos são notáveis: supressão do crescimento bacteriano, redução da inflamação induzida por vesículas bacterianas e regulação precisa da expressão de receptores.4

Os mecanismos de ação incluem uma modulação receptorial sofisticada, com regulação positiva de CB2R e regulação negativa de TRPV1, além da inativação de vias inflamatórias como MAPK e NF-κB. Estudos demonstram que os canabinoides podem reduzir a produção sebácea, normalizar a atividade das glândulas sebáceas e apresentar uma ação anti-inflamatória pronunciada.5

A compreensão do SEC transcende a visão tradicional dos tratamentos dermatológicos. Ele representa uma perspectiva inovadora que visa aprimorar fundamentalmente a abordagem ao cuidado da pele. Assim como a cannabis medicinal tem demonstrado potencial como parte de uma intervenção multimodal para diversas condições dermatológicas, o SEC oferece um novo caminho para explorar e otimizar os tratamentos existentes.

As descobertas recentes não apenas ampliam nosso entendimento dos mecanismos cutâneos, mas abrem horizontes terapêuticos inovadores. O Sistema Endocanabinoide emerge como uma fronteira promissora na dermatologia, capaz de oferecer tratamentos personalizados para condições cutâneas, com uma abordagem multifuncional para oleosidade e inflamação.

Evidências Científicas

A acne e a seborreia são distúrbios dermatológicos frequentes, caracterizados pela produção excessiva de sebo pelas glândulas sebáceas. Recentemente, os canabinoides têm emergido como uma alternativa promissora no tratamento dessas condições, com diversos estudos científicos investigando seus mecanismos de ação e potenciais benefícios.

O canabidiol (CBD) tem se destacado como um agente terapêutico particularmente interessante. Diferentemente dos endocanabinoides tradicionais, o CBD apresenta mecanismos únicos de atuação. Estudos in vitro demonstraram sua capacidade de normalizar a lipogênese das células sebáceas sem comprometer sua viabilidade, reduzir a proliferação celular e diminuir os níveis de citocinas pró-inflamatórias.³

Resultados científicos particularmente significativos foram observados em diferentes estudos. Um ensaio clínico não controlado com 30 indivíduos revelou resultados promissores: uma formulação tópica contendo CBD e terpenos de Centella asiática e Silybum marianum mostrou efeitos anti-inflamatórios e inibição do crescimento de Cutibacterium acnes. Os pesquisadores identificaram uma redução progressiva das lesões acneicas: 31,8% após 28 dias, elevando-se para 38,2% no período de 42 dias e alcançando impressionantes 70,9% após 56 dias de tratamento.6

Outro estudo clínico simples-cego, envolvendo 11 pacientes, comprovou a eficácia de um creme com extrato de semente de cannabis a 3%, aplicado duas vezes ao dia durante 12 semanas. Os resultados demonstraram melhora significativa na produção de sebo e redução do eritema, mensurados através de espectrofotômetro de refletância.7

Um estudo adicional com extratos de sementes de cânhamo evidenciou efeitos antimicrobianos contra Cutibacterium acnes, além de propriedades anti-inflamatórias e capacidade de inibir enzimas inflamatórias. Os pesquisadores sugerem que esses efeitos podem estar relacionados ao alto teor de ácidos graxos poli-insaturados nos extratos.8

A penetração transdérmica dos canabinoides já foi confirmada, o que abre possibilidades promissoras para o desenvolvimento de preparações farmacêuticas tópicas. Um ensaio clínico de fase 2 registrado no ClinicalTrials.gov avaliou uma solução tópica de CBD a 5% em mais de 360 pacientes, observando uma redução de 40% nas lesões de acne após 12 semanas de tratamento.9

Em conclusão, a modulação do Sistema Endocanabinoide da pele e a ação dos canabinoides representa uma abordagem inovadora para regular a produção sebácea e tratar condições como acne e seborreia. Embora os achados atuais sejam promissores, são necessários mais estudos clínicos para elucidar os mecanismos envolvidos e validar seus benefícios terapêuticos.

Conclusão

Os avanços científicos sobre o SEC e sua influência na regulação da oleosidade da pele abrem um novo horizonte terapêutico para a dermatologia. A interação dos canabinoides com receptores sebáceos não apenas regula a produção de sebo, mas também exerce ação anti-inflamatória e antimicrobiana, tornando-se uma opção promissora para o manejo de condições como acne e dermatite seborreica.

Compreender a complexidade desse sistema permite a criação de abordagens terapêuticas mais eficazes e personalizadas. O uso de canabinoides no cuidado com a pele representa um avanço significativo, possibilitando tratamentos inovadores que respeitam a fisiologia cutânea e minimizam efeitos adversos, promovendo uma dermatologia mais precisa e funcional.

Para que a incorporação da Cannabis na prática clínica ocorra de forma segura e eficaz, é essencial que os médicos tenham acesso a informações atualizadas e baseadas em evidências científicas. Nesse contexto, a Comunidade da WeCann Academy se destaca como um espaço fundamental para essa atualização, oferecendo uma rede global de profissionais altamente capacitados. Nesse ambiente colaborativo, os médicos e acadêmicos trocam conhecimentos, discutem casos clínicos desafiadores e exploram novas estratégias terapêuticas, garantindo que estejam sempre preparados para implementar as abordagens mais eficazes no tratamento com cannabis medicinal.

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Referências

  1. Endly, Dawnielle C, and Richard A Miller. “Oily Skin: A review of Treatment Options.” The Journal of clinical and aesthetic dermatology vol. 10,8 (2017): 49-55.
  2. MONTAGNER, Patrícia; DE SALAS-QUIROGA, Adán. Tratado de Medicina Endocanabinoide.1. ed. WeCann Endocannabinoid Global Academy, 2023.
  3. Yoo, Eun Hee, and Ji Hyun Lee. “Cannabinoids and Their Receptors in Skin Diseases.” International journal of molecular sciences vol. 24,22 16523. 20 Nov. 2023, doi:10.3390/ijms242216523
  4. Oláh A., Tóth B.I., Borbíró I., Sugawara K., Szöllõsi A.G., Czifra G., Pál B., Ambrus L., Kloepper J., Camera E., et al. Cannabidiol exerts sebostatic and antiinflammatory effects on human sebocytes. J. Clin. Investig. 2014;124:3713–3724. doi: 10.1172/JCI64628.
  5. Jiang Z., Jin S., Fan X., Cao K., Liu Y., Wang X., Ma Y., Xiang L. Cannabidiol Inhibits Inflammation Induced by Cutibacterium acnes-Derived Extracellular Vesicles via Activation of CB2 Receptor in Keratinocytes. J. Inflamm. Res. 2022;15:4573–4583. doi: 10.2147/JIR.S374692. 
  6. Cohen, G., Jakus, J., Baroud, S., Gvirtz, R. & Rozenblat, S. Development of an Effective Acne Treatment Based on CBD and Herbal Extracts: Preliminary In Vitro, Ex Vivo, and Clinical Evaluation. Evid. Based Complement. Alternat. Med. 2023, 1-8 (2023).
  7. Ali A., Akhtar N. The safety and efficacy of 3% Cannabis seeds extract cream for reduction of human cheek skin sebum and erythema content. Pak. J. Pharm. Sci. 2015;28:1389–1395.
  8. .Vaughn A.R., Clark A.K., Sivamani R.K., Shi V.Y. Natural oils for skin-barrier repair: Ancient compounds now backed by modern science. Am. J. Clin. Dermatol. 2018;19:103–117. doi: 10.1007/s40257-017-0301-1.
  9. Botanix Pharmaceuticals . ASX/Media Release: BTX 1503 Acne Phase 2 Study Results Presentation. Botanix Pharmaceuticals; Philadelphia, PA, USA: Syndey, Australia: 2019. [(accessed on 9 September 2021)].
Esse texto foi elaborado pelo time de experts da WeCann, baseado nas evidências científicas partilhadas nas referências e, amparado na ampla experiência prescritiva dos profissionais.

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