A desinformação precede o preconceito. Por desconhecerem os atributos medicinais do Tetrahidrocanabinol, muitos segmentos da indústria, da mídia e até colegas médicos discriminam o uso medicinal desse fitocanabinoide.
Somente o conhecimento e a informação são capazes de transformar este cenário. Veja por que vale a pena descobrir as ricas propriedades terapêuticas do THC.
Psicoatividade versus psicotoxicidade no uso do THC
A confusão entre esses dois conceitos é, muitas vezes, a grande responsável pelo receio dos médicos na prescrição de produtos ricos em THC. Muitos colegas têm a tendência a receitar apenas o CBD, ignorando o potencial do THC devido às suas propriedades psicoativas.
No entanto, precisamos esclarecer que, apesar de sua psicoatividade, o THC é tão importante farmacologicamente quanto o CBD, apresentando um potencial terapêutico único.
O CBD, por sua vez, embora não apresente efeitos psicoativos potencialmente intoxicantes, também é capaz de alterar o estado de consciência das pessoas.
Ou seja, ao contrário do que muita gente pensa, o CBD apresenta sim psicoatividade. Algumas reações incluem:
- O estado de alerta, que deixa as pessoas mais atentas e dispostas;
- A sonolência, principalmente se utilizado de forma isolada ou se titulado em altas doses.
Ambos esses estados são exemplos de reações psicoativas.
Mas é importante diferenciar psicoatividade e psicotoxicidade no uso dos fitocanabinoides CBD e THC.
Apesar de o CBD apresentar potencial psicoativo, ele não apresenta o potencial intoxicante do THC. Mesmo assim, reações psicotóxicas decorrentes do uso de THC são raras em um contexto de uso medicinal desse composto.
Sensações de relaxamento, bom humor, facilidade de socialização e intensificação do prazer em atividades cotidianas, como se alimentar ou assistir a um filme, nada têm a ver com psicotoxicidade (agitação psicomotora, alucinações visuais e auditivas, sensação de perseguição, ansiedade generalizada, etc.).
Portanto, não se deve confundir um estado eufórico decorrente do uso de THC com psicotoxicidade.
Inclusive, esses momentos euforizantes decorrentes da prescrição assertiva do THC podem resultar em experiências transformadoras para muitos pacientes que estão em estado de profundo sofrimento, tanto físico quanto psíquico, representando uma estratégia terapêutica eficaz no controle de diversos quadros clínicos.
Propriedades terapêuticas do THC
Desfeito o mito da psicotoxicidade no uso do THC, vamos agora aos principais atributos medicinais desse fitocanabinoide.
1. Modifica a percepção do estímulo doloroso
O THC é fundamental em casos de dor crônica, pois atua em receptores endocanabinoides do córtex sensitivo-motor e da amígdala, modulando os componentes emocionais e cognitivos relacionados à percepção da dor.
O estudo de Lee e colaboradores (2013), avaliou o uso de THC na redução da dor induzida. Nos indivíduos avaliados, a redução no desconforto da hiperalgesia foi positivamente correlacionada com a atividade da amígdala direita. Os resultados revelam que a atividade da amígdala contribuiu para a resposta interindividual à analgesia canabinoide e sugere que os efeitos dissociativos do THC no cérebro de fato são relevantes para o alívio da dor.
Além disso, o efeito analgésico sinérgico do THC concomitante aos opioides, pelo menos em parte, é mediado por receptores delta e kappa, indicando uma conexão íntima entre as vias de sinalização de canabinoides e opioides na modulação da percepção da dor.
2. É anti-espasmódico e relaxante muscular
É bastante evidente o efeito anti-espasmódico e relaxante muscular do THC. A primeira formulação à base de Cannabis registrada em vários órgãos regulatórios do mundo, o Sativex®, foi aprovada para tratamento da dor associada à espasticidade da Esclerose Múltipla.
O THC modifica a percepção do estímulo doloroso e reduz a espasticidade não só nos pacientes portadores de Esclerose Múltipla, mas também de muitos outros que apresentam espasmos musculares advindos de sequelas neurológicas após um AVC ou TCE, por exemplo.
3. Indutor do apetite e do sono
Talvez uma das atribuições mais conhecidas e documentadas do THC seja como estimulante do apetite. Por isso, medicamentos à base de Cannabis enriquecidos em THC são ministrados com sucesso em pacientes oncológicos e pacientes portadores de doenças que induzem à caquexia, como SIDA e alguns transtornos neuropsiquiátricos.
Outra importante propriedade do THC, especialmente quando associado ao terpeno mirceno, é a indução do sono. Diversos estudos têm demonstrado esse “efeito colateral” do THC. Inclusive, na prática, é comum conseguirmos reduzir e desmamar o uso de benzodiazepínicos de pacientes que sofrem de insônia e demais transtornos do sono.
4. Tem grande potencial anti-emético
O potencial anti-emético é mais uma propriedade medicinal do THC, já bastante conhecida e explorada há milênios. Vários estudos já demonstraram uma redução dramática na emese associada ao uso de quimioterápicos com o uso de canabinoides sintéticos, como o dronabinol e a nabilona.
Em pacientes com câncer, o THC além de apresentar efeito anti-emético, estimula o apetite, reduz quadros de dor e ansiedade e ainda induz um melhor padrão de sono, sendo um complemento terapêutico valioso em pacientes oncológicos, em regimes de radio e quimioterapia.
Acessar conhecimento científico qualificado é fundamental para combater a desinformação e, consequentemente, o preconceito. Na WeCann Academy, ajudamos médicos a acessarem esse conhecimento disruptivo e a incorporarem novas ferramentas terapêuticas, com segurança e eficácia.
Quer fazer parte desta comunidade? Entre em contato conosco e saiba mais a respeito!
Referências
BABSON, Kimberly A.; SOTTILE, James; MORABITO, Danielle. Cannabis, Cannabinoids, and Sleep: a Review of the Literature. Current psychiatry reports, v. 19, n. 4, p. 23, 2017.
RUSSO, Ethan B.; GUY, Geoffrey W.; ROBSON, Philip J. Cannabis, pain, and sleep: lessons from therapeutic clinical trials of Sativex, a cannabis-based medicine. Chemistry & biodiversity, v. 4, n. 8, p. 1729-1743, 2007.
Meiri E, Jhangiani H, Vredenburgh JJ, Barbato LM, Carter FJ, Yang HM, Baranowski V. Efficacy of dronabinol alone and in combination with ondansetron versus ondansetron alone for delayed chemotherapy-induced nausea and vomiting. Curr Med Res Opin. 2007 Mar;23(3):533-43. doi: 10.1185/030079907×167525. PMID: 17355735.
Lee MC, Ploner M, Wiech K, Bingel U, Wanigasekera V, Brooks J, Menon DK, Tracey I. Amygdala activity contributes to the dissociative effect of cannabis on pain perception. Pain. 2013 Jan;154(1):124-134. doi: 10.1016/j.pain.2012.09.017. PMID: 23273106; PMCID: PMC3549497.