Dores crônicas associadas a osteoartrites e osteoartroses e transtornos neurodegenerativos, como doença de Parkinson e demência de Alzheimer são exemplos de condições frequentemente encontradas em idosos. Existe uma estreita relação entre o avanço da idade e o desequilíbrio no Sistema Endocanabinoide, que pode facilitar o aparecimento e progressão dessas doenças. Por isso, destacamos nesse conteúdo, o potencial terapêutico dos medicamentos à base de Cannabis na terceira idade.
No entanto, todos sabemos que existem particularidades clínicas importantes no acompanhamento e manejo terapêutico de idosos, e com cannabis medicinal não é diferente. É preciso conhecimento e experiência para fazer prescrições seguras e assertivas de medicamentos à base de cannabis nessa população específica de pacientes.
Se você deseja incorporar esse vasto arsenal terapêutico em sua prática prescritiva, leia e guarde este guia. Explicaremos as principais utilizações da Cannabis medicinal em idosos e como fazer uma prescrição eficaz. Confira!
O Sistema Endocanabinoide nos idosos
Descoberta relativamente recente da ciência, o Sistema Endocanabinoide (SEC) é um conjunto de receptores, ligantes e enzimas que atuam como sinalizadores entre as células, modulando processos fisiopatológicos diversos.
Esses receptores e substâncias endocanabinoides estão presentes em todos os órgãos e sistemas do nosso corpo, executando diferentes tarefas visando estabelecer a homeostase do organismo.
O equilíbrio dos sistemas corporais é fundamental para a saúde, pois qualquer desequilíbrio nas funções fisiológicas pode ser decisivo para o desenvolvimento e progressão de doenças. Os idosos são mais suscetíveis a esse desbalanceamento justamente porque, quanto mais envelhecemos, menos substâncias endocanabinoides nosso organismo produz. Além disso, a quantidade de receptores endocanabinoides que seriam ativados por esses ligantes também é menor, interferindo diretamente no processo homeostático.
Essa pesquisa publicada em 2016 na revista científica Cannabis and Cannabinoid Research evidencia essa relação entre deficiência de substâncias endocanabioides e o desenvolvimento e/ou progressão de doenças.
Conforme o estudo, pessoas com baixos níveis de endocanabinoides anandamida e 2-araquidonoilglicerol apresentam maior chance de desenvolver doenças inflamatórias e do Sistema Nervoso Central, como enxaqueca, fibromialgia e síndrome do intestino irritável.
>> Leia o estudo completo em: Clinical Endocannabinoid Deficiency Reconsidered: Current Research Supports the Theory in Migraine, Fibromyalgia, Irritable Bowel, and Other Treatment-Resistant Syndromes.
Vantagens para o tratamento de idosos com Cannabis Medicinal
Entre as atividades fisiológicas moduladas pelo Sistema Endocanabinoide, destacamos os processos inflamatórios, o apetite e o trânsito gastrointestinal, o ciclo sono-vigília, a plasticidade neuronal e os processos relacionados à memória. O comprometimento de algumas dessas funções tende a se agravar nos idosos, devido à mudança de tônus do SEC nos pacientes da terceira idade.
Nessa perspectiva, os fitocanabinoides surgem como uma alternativa eficaz no tratamento e controle de diversas disfunções, suprindo a lacuna de performance do Sistema Endocanabinoide e trazendo mais qualidade de vida para os idosos em variados quadros clínicos. A seguir, listamos os benefícios da Cannabis Medicinal nesses contextos.
Doença de Alzheimer e outras demências
A demência de Alzheimer é a doença neurodegenerativa mais comum no mundo e a principal causa de dependência funcional, institucionalização e morte de idosos no Brasil.
Os estudos científicos sugerem que a Cannabis medicinal é uma terapia promissora para auxiliar nesse tratamento, pois apresenta poucos efeitos colaterais e age nos principais mecanismos fisiopatológicos da doença, como na redução da neuroinflamação e na regulação de neurotransmissores.
Além disso, os fitocanabinoides também apresentam potenciais resultados no combate aos sintomas decorrentes do Alzheimer e outras demências. O uso adjuvante dos derivados canabinoides melhora o bem-estar e a qualidade de vida dos pacientes e seus cuidadores em quadros de agitação psicomotora, redução do apetite e transtornos do sono.
Quanto à redução da neuroinflamação, este estudo pré-clínico publicado em 2014 no Journal of Alzheimer’s Disease analisou os efeitos terapêuticos do THC na doença. Os resultados mostraram que esse fitocanabinoide ajudou a retardar a deposição das placas beta-amiloides – aglomerados de proteínas que se acumulam no cérebro indicando o início e progressão da doença de Alzheimer.
>> Leia o estudo completo em: The potential therapeutic effects of THC on Alzheimer’s disease.
>> Acesse este post e conheça outras evidências científicas do uso da Cannabis medicinal na doença de Alzheimer!
Doença de Parkinson
A Doença de Parkinson é outra doença relacionada à neuroinflamação e estresse oxidativo, que induz à morte de redes neuronais específicas. Essa é a segunda doença neurodegenerativa mais comum no mundo. Os derivados canabinoides, por meio de diferentes ações neuroprotetoras, são capazes de promover a redução dos sintomas motores e não motores da doença.
É o que mostra esta pesquisa alemã publicada em 2021, realizada através de um questionário com 1.348 participantes. Destes, 8,4% eram usuários de Cannabis Medicinal. Os resultados no grupo de usuários incluem redução da dor e cãibras musculares (40%) e melhora em relação à rigidez, tremores, depressão e ansiedade (20%).
Interessante notar, que em relação ao uso comparativo do CBD e do THC, o segundo foi mais efetivo: 68% dos usuários de produtos ricos em THC apontaram melhoras nos sintomas parkinsonianos. Entre os usuários de produtos ricos em CBD, 54% relataram melhoras.
>> Leia o estudo completo em: Cannabis in Parkinson’s Disease: The Patients’ View.
>> Acesse este post e conheça mais evidências científicas do uso da Cannabis medicinal na doença de Parkinson!
Dor crônica
Idosos são o público que mais consome medicamentos no país, segundo a Associação Brasileira de Distribuição e Logística de Produtos Farmacêuticos (Abradilan). Um dos principais motivos é a dor crônica. Segundo a Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia, cerca de 50% dos idosos em atendimento ambulatorial têm essa queixa, e a incidência pode chegar a 80% nos residentes de instituições de longa permanência.
Além de já existirem evidências científicas conclusivas e substanciais de que derivados canabinoides são efetivos no combate à dor crônica, a cannabis medicinal pode ser uma ferramenta valiosa na racionalização do uso de medicamentos na população idosa, evitando os agravos advindos da polifarmácia.
Nesse contexto, destaca-se o potencial de redução de dose e desmame do uso de derivados opióides e benzodiazepínicos, frequentemente utilizados para tratar dor crônica, ansiedade e insônia na terceira idade. Os canabinoides apresentam propriedades que auxiliam no combate a efeitos adversos comuns dessas medicações, como irritabilidade, náuseas, inapetência, constipação intestinal, letargia e fadiga. Além disso, existe um efeito sinérgico na associação entre derivados opioides e canabinoides, prevenindo o desenvolvimento da tolerância aos opioides e, por consequência, evitando a necessidade de aumento da dosagem dessas medicações.
Os fitocanabinoides CBD e THC ajudam a modular os componentes emocionais e cognitivos relacionados à percepção da dor em diversos contextos clínicos, como evidenciado nesta pesquisa canadense publicada em 2021. O estudo mostrou que, após dar início ao tratamento com Cannabis medicinal, um grupo de pacientes conseguiu reduzir em cerca de 5 vezes a dosagem diária média de morfina para controlar dores crônicas.
>> Leia o estudo completo em: Cannabis Significantly Reduces the Use of Prescription Opioids and Improves Quality of Life in Authorized Patients: Results of a Large Prospective Study.
>> Para saber mais sobre Cannabis medicinal e desmame de opioides, acesse este post e conheça as propriedades analgésicas dos fitocanabinoides!
Ansiedade e depressão
Transtornos de ansiedade e depressão comumente também acometem os idosos. Problemas crônicos de saúde, perda de entes queridos e isolamento social são alguns fatores que podem impulsionar esses quadros. Nesse contexto, a Cannabis medicinal é uma alternativa promissora porque apresenta propriedades ansiolíticas capazes de reduzir as crises de ansiedade e depressão, através do estímulo de receptores serotoninérgicos, dentre outros mecanismos de ação.
Outros transtornos psiquiátricos como Transtorno de estresse pós-traumático (TEPT), síndrome de pânico e fobias diversas também podem ser aliviados com o uso de fitocanabinoides. É o que sugere esta revisão bibliográfica publicada em 2019 no periódico científico Current Psychiatry Reports.
>> Leia o estudo completo em: Cannabinoid Regulation of Fear and Anxiety: an Update.
Distúrbios do sono
Insônia e parassonias são distúrbios do sono frequentes em idosos. Muitas vezes, essas condições estão associadas a outras doenças, podendo ser consequência de quadros de ansiedade, depressão, demências e outras doenças clínicas.
Nessas situações, o uso medicinal do THC demonstra ser uma alternativa eficaz e com menos efeitos colaterais quando comparado ao uso crônico de benzodiazepínicos.
Vale lembrar que o THC apresenta um perfil terapêutico diferenciado, frente inclusive, ao CBD. Esse canabinoide apresenta importante potencial terapêutico não só nos transtornos do sono, mas também, na estimulação do apetite e na melhora do humor. Esses fatores contribuem muito para a qualidade de vida do idoso, especialmente quando se encontram em cuidados paliativos decorrentes de doenças graves e incapacitantes como câncer, parkinson e alzheimer.
>> Quer conhecer mais sobre os atributos medicinais do THC? Acesse este post para desconstruir os mitos que envolvem o uso medicinal dessa substância!
Câncer
Após os 65 anos, as nossas chances de ter câncer aumentam gradativamente. Segundo o Instituto Nacional de Câncer (Inca), idosos possuem 11 vezes mais chances de desenvolver a doença do que os mais jovens.
Muitos estudos que sugerem o potencial antineoplásico dos derivados canabinoides estão em desenvolvimento, mas o uso da cannabis medicinal como adjuvante no paciente com câncer já é bastante explorado – seja para combater os sintomas decorrentes do tratamento oncológico, seja para combater os sintomas da doença em si.
Dor crônica, fadiga, ansiedade, depressão e insônia, sintomas comuns decorrentes da doença e quadros de náuseas, vômitos e inapetência decorrentes dos regimes de radio e quimioterapia podem ser aliviados com a terapêutica canabinoide, como bem demonstra esta revisão bibliográfica publicada em 2019.
>> Leia a revisão completa em: Opportunities for cannabis in supportive care in cancer.
Embora as pesquisas científicas apontem para os diversos benefícios da terapêutica canabinoide, as prescrições precisam ser criteriosas e assertivas para alcançar bons resultados. Especialmente no caso dos idosos, onde existe maior perfil de risco para a ocorrência de efeitos adversos e interações medicamentosas.
Portadores de doenças cardiovasculares graves e instáveis e portadores de doenças psiquiátricas não tratadas são exemplos de pacientes que demandam uma prática prescritiva ainda mais cuidadosa. Nessas situações, as doses são tituladas ainda mais lentamente até que se encontre a dosagem ótima, ou seja, que otimiza resultados terapêuticos, ao mesmo tempo que modula potenciais efeitos adversos.
Somente uma educação tecnicamente adequada na área é capaz de proporcionar esse conhecimento disruptivo aos médicos que desejam prescrever derivados canabinoides com segurança e eficácia. A WeCann Academy é comprometida com essa jornada de aprendizado e através da Certificação Internacional em Medicina Endocanabinoide.
Conectamos especialistas de todo o mundo em uma comunidade global de estudos e pesquisas em Sistema Endocanabinoide para interligar de forma altamente qualificada, conhecimento científico e experiência prática no uso medicinal da Cannabis.
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Referências
Cao C, Li Y, Liu H, Bai G, Mayl J, Lin X, Sutherland K, Nabar N, Cai J. The potential therapeutic effects of THC on Alzheimer’s disease. J Alzheimers Dis. 2014.
Kleckner AS, Kleckner IR, Kamen CS, Tejani MA, Janelsins MC, Morrow GR, Peppone LJ. Opportunities for cannabis in supportive care in cancer. Ther Adv Med Oncol. 2019.
Lucas P, Boyd S, Milloy MJ, Walsh Z. Cannabis Significantly Reduces the Use of Prescription Opioids and Improves Quality of Life in Authorized Patients: Results of a Large Prospective Study. Pain Med. 2021.
Papagianni EP, Stevenson CW. Cannabinoid Regulation of Fear and Anxiety: an Update. Curr Psychiatry Rep. 2019.
Russo EB. Clinical Endocannabinoid Deficiency Reconsidered: Current Research Supports the Theory in Migraine, Fibromyalgia, Irritable Bowel, and Other Treatment-Resistant Syndromes. Cannabis Cannabinoid Res. 2016.
Yenilmez F, Fründt O, Hidding U, Buhmann C. Cannabis in Parkinson’s Disease: The Patients’ View. J Parkinsons Dis. 2021.