Canabidiol para dores articulares: Um potencial terapêutico em expansão

Publicado em 05/09/24 | Atualizado em 11/09/24 Leitura: 8 minutos

Canabidiol (CBD)Cannabis como MedicamentoReumatológicas

As dores articulares, frequentemente associadas a condições como osteoartrite, artrite reumatoide e outras doenças inflamatórias, representam um desafio clínico significativo. A busca por tratamentos eficazes e seguros para aliviar esses sintomas é constante. O uso de canabidiol (CBD) como uma opção terapêutica para dores articulares está ganhando destaque, especialmente devido ao crescente corpo de evidências científicas que apontam para suas propriedades analgésicas e anti-inflamatórias. Neste post, vamos explorar o potencial do CBD no tratamento das dores articulares, abordando seus mecanismos de ação, a evidência clínica existente, e as considerações práticas para sua aplicação no contexto médico.

O que é o Canabidiol?

O canabidiol é um dos muitos fitocanabinoides presentes na planta Cannabis sativa. Ao contrário do tetraidrocanabinol (THC), o CBD não possui propriedades psicotrópicas, ou seja, não causa euforia ou alteração importante no estado mental. Essa característica torna o CBD uma opção terapêutica atraente para pacientes que buscam alívio da dor sem potenciais efeitos colaterais associados ao THC.

Entendendo as dores articulares

As dores articulares são sintomas comuns em várias doenças reumáticas, como Osteoartrite, Artrite Reumatoide , Lúpus Eritematoso Sistêmico (LES) e Fibromialgia. Essas condições afetam as articulações e outros tecidos conjuntivos, levando a sintomas como dor crônica, rigidez, inflamação e perda funcional. As articulações mais comumente afetadas incluem quadris, joelhos, mãos e coluna vertebral.¹ A prevalência dessas doenças aumenta com a idade, tornando-se uma das principais causas de incapacitação em idosos.

O Papel do Sistema Endocanabinoide

O sistema endocanabinoide (SEC) desempenha um papel central na regulação da dor e da inflamação, sendo uma área de grande interesse no estudo das dores articulares. O SEC é composto por receptores canabinoides, endocanabinoides e enzimas envolvidas na síntese e degradação desses compostos. Os receptores CB1 e CB2 são os mais estudados, sendo o CB1 predominante no sistema nervoso central e o CB2 nas células do sistema imunológico.¹

Nos tecidos articulares, incluindo condrócitos, osteoclastos e fibroblastos sinoviais, os receptores canabinoides estão presentes e sua ativação tem mostrado inibir a liberação de mediadores da dor e reduzir a nocicepção. Estudos indicam que os endocanabinoides, como a anandamida e o 2-AG, estão presentes em níveis elevados no líquido sinovial de pacientes com OA e AR, sugerindo uma supraregulação do tônus do sistema endocanabinoide como uma resposta adaptativa à inflamação articular.²

A modulação do sistema endocanabinoide pode influenciar diversos aspectos da biologia das articulações. O diagrama abaixo ilustra os efeitos funcionais de diferentes moléculas canabinoides, que atuam sobre componentes distintos do SEC. Evidências pré-clínicas em modelos de osteoartrite sugerem que tratamentos à base de cannabis podem não apenas reduzir a degradação da cartilagem, mas também, promover seu reparo. Além disso, esses tratamentos podem favorecer a remodelação óssea, induzindo apoptose e inibindo a formação de osteoclastos. Os derivados canabinoides também atuam nos sinoviócitos como potentes agentes anti-inflamatórios, contribuindo para a preservação da integridade articular. Especificamente, os agonistas sintéticos HU210 e WIN55,212-2 ativam tanto os receptores CB1 quanto CB2; JWH133 e HU308 são agonistas seletivos para o receptor CB2; e AM251 é um agonista inverso seletivo para o receptor CB1.³

Representação esquemática da modulação do SEC na biologia articular.  Fonte: MONTAGNER, Patrícia; DE SALAS-QUIROGA, Adán. Tratado de Medicina Endocanabinoide.1. ed. WecCann Endocannabinoid Global Academy, 2023.
Representação esquemática da modulação do SEC na biologia articular.  Fonte: MONTAGNER, Patrícia; DE SALAS-QUIROGA, Adán. Tratado de Medicina Endocanabinoide.1. ed. WecCann Endocannabinoid Global Academy, 2023.

 

Para saber mais sobre o Sistema Endocanabinoide acesse: O que é o Sistema Endocanabinoide? (wecann.academy)

Canabidiol e dores articulares

O CBD exerce seus efeitos terapêuticos através de múltiplos mecanismos de ação. Embora tenha baixa afinidade pelos receptores CB1 e CB2, o CBD modula indiretamente o SEC, aumentando os níveis de endocanabinoides ao inibir as enzimas responsáveis por sua degradação, como a FAAH (amida hidrolase de ácido graxo). Além disso, o CBD interage com outros receptores, como o TRPV1, que está envolvido na modulação da dor e da inflamação, e os receptores 5-HT1A, que mediam efeitos ansiolíticos.¹ No contexto das dores articulares, o CBD tem mostrado potencial para reduzir a inflamação sinovial, proteger contra a degradação da cartilagem e modular a resposta imune, aliviando, assim, a dor e melhorando a mobilidade das articulações afetadas.

Evidências Clínicas

Em consonância com sua crescente popularidade, o canabidiol tem se destacado como uma opção promissora para o manejo da dor nas articulações, particularmente em casos de artrite. De acordo com uma pesquisa da Gallup realizada em 2019, 14% dos adultos americanos relataram o uso de produtos contendo CBD, com 40% dessas pessoas buscando alívio para a dor e 8% especificamente para artrite.4  

Um estudo controlado randomizado duplo-cego conduzido por Heineman et al. (2022) avaliou o efeito da aplicação tópica de CBD isolado em pacientes com dor local associada à artrite da articulação do polegar. Neste estudo, 18 participantes foram tratados duas vezes ao dia com 1 mL de uma loção contendo 6,2 mg/mL de CBD ou manteiga de karité como controle placebo. Após duas semanas de tratamento, aqueles que utilizaram CBD relataram melhorias significativas em várias medidas de dor e incapacidade, em comparação com o grupo controle.5

Outro exemplo relevante é um estudo realizado em 2018 que evidenciou as propriedades terapêuticas do CBD no tratamento da dor causada pela osteoartrite, uma das formas mais prevalentes de dor crônica. A osteoartrite tipicamente apresenta uma combinação de dor inflamatória, nociceptiva e neuropática, o que demanda uma abordagem terapêutica abrangente. Nesse estudo, o CBD demonstrou eficácia significativa na redução da dor associada à OA, corroborando seu potencial como uma opção valiosa no tratamento dessa condição debilitante.6

Embora o CBD tenha mostrado um grande potencial terapêutico no manejo das dores articulares, mais estudos clínicos são necessários para determinar as doses ideais, a duração do tratamento e os possíveis efeitos adversos a longo prazo. Além disso, a interação do CBD com outros medicamentos usados no tratamento das doenças articulares deve ser cuidadosamente avaliada para evitar interações medicamentosas adversas.

Conclusão

O canabidiol surge como uma alternativa promissora no manejo das dores articulares, a sua capacidade de modular o sistema endocanabinoide, reduzindo a inflamação sinovial, protegendo a cartilagem e modulando a resposta imunológica, destaca-se como um mecanismo de ação valioso. As evidências clínicas recentes também reforçam o potencial terapêutico desse fitocanabinoide nesse cenário clínico. No entanto, é crucial que as pesquisas continuem a explorar as melhores estratégias prescritivas, incluindo tipo de formulação e dose, e possíveis interações medicamentosas para garantir a segurança e eficácia a longo prazo. À medida que o conhecimento sobre o CBD se expande, ele pode se consolidar como uma ferramenta valiosa para o manejo da dor articular, proporcionando aos pacientes uma opção adicional e eficaz para melhorar a qualidade de vida e a funcionalidade articular.

Portanto, é de grande importância que os médicos se atualizem continuamente sobre o uso medicinal da cannabis e outros tópicos relacionados, para que possam oferecer a melhor abordagem terapêutica para os seus pacientes. Nesse contexto, a WeCann, referência internacional em educação médica na área, disponibiliza recursos e informações tecnicamente qualificadas e atualizadas sobre cannabis medicinal, auxiliando os médicos no processo de tomada de decisão clínica e na implementação de terapêuticas personalizadas e seguras, promovendo um atendimento de excelência, sempre alinhado com as mais recentes evidências científicas.

Referências

  1. MONTAGNER, Patrícia; DE SALAS-QUIROGA, Adán. Tratado de Medicina Endocanabinoide.1. ed. WeCann Endocannabinoid Global Academy, 2023.
  2. Richardson, D. et al. Characterisation of the cannabinoid receptor system in synovial tissue and Auid in patients with osteoarthritis and rheumatoid arthritis. Arthritis Res, Ther, 10, R43 (2008). 
  3. Malek, N. & Starowicz, K. Joint problems arising from lack of repair mechanisms: can cannabinoids help?: Cannabinoids for OA treatment. Br. J. Pharmacol. 176, 1412-1420 (2019).
  4. BRENAN, Megan. 14% of Americans Say They Use CBD Products. *Wellbeing*, 7 ago. 2019. Disponível em: [https://news.gallup.com](https://news.gallup.com). Acesso em: 11 ago. 2024.
  5. Heineman, J. T. et al. A Randomized Controlled Trial of Topical Cannabidiol for the Treatment of Thumb Basal Joint Arthritis. J. Hand Surg, 47, 611-620 (2022).
  6. Gusho CA, Court T. Cannabidiol: A Brief Review of Its Therapeutic and Pharmacologic Efficacy in the Management of Joint Disease. Cureus. 2020 Mar 23;12(3):e7375. doi: 10.7759/cureus.7375. PMID: 32328386; PMCID: PMC7176325.
Esse texto foi elaborado pelo time de experts da WeCann, baseado nas evidências científicas partilhadas nas referências e, amparado na ampla experiência prescritiva dos profissionais.

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