A osteoartrite representa uma das formas mais comuns e incapacitantes de doença articular, caracterizada pela degeneração progressiva da cartilagem, inflamação crônica das articulações e eventual comprometimento funcional. Essa condição crônica afeta milhões de pessoas globalmente, resultando em dor persistente, rigidez e limitação de movimentos que afetam significativamente a qualidade de vida dos pacientes. Diante das limitações dos tratamentos convencionais no controle dos sintomas, cresce o interesse pelo potencial terapêutico da cannabis como uma alternativa promissora. Neste post, explicaremos como a cannabis pode oferecer alívio da dor e melhorar a função articular na osteoartrite, destacando os avanços recentes e as implicações clínicas dessa abordagem emergente.
O que é Osteoartrite?
A osteoartrite (OA) é uma doença reumática degenerativa crônica que afeta as articulações sinoviais, caracterizada pela progressiva degeneração da cartilagem articular, remodelação óssea adjacente, formação de osteófitos e inflamação sinovial. Esta condição culmina em dor crônica, rigidez articular e limitação funcional, substancialmente comprometendo a qualidade de vida dos pacientes. Predominantemente manifestando-se em articulações de carga como quadris, joelhos, mãos e coluna vertebral.
A OA representa um desafio significativo, pois os tratamentos convencionais frequentemente são falhos em controlar eficazmente os sintomas para muitos pacientes. Além disso, podem estar associados a uma gama de efeitos colaterais significativos, como problemas gastrointestinais com o uso de analgésicos e anti-inflamatórios não esteroidais (AINEs), ou riscos de infecção com corticosteroides e até complicações cirúrgicas em intervenções mais invasivas. Neste contexto, a cannabis emerge como uma alternativa viável, oferecendo potencial para mitigar a dor e melhorar a funcionalidade articular. A capacidade dos canabinoides em modular a dor e a inflamação os torna alvos promissores para intervenções terapêuticas na OA, apresentando-se como um campo de estudo em expansão na medicina atual.
O Sistema Endocanabinoide na Osteoartrite
O Sistema Endocanabinoide (SEC) desempenha um papel crucial na regulação de diversos processos fisiopatológicos associados à origem, progressão e sintomas das doenças reumáticas, incluindo a osteoartrite (OA). Estes processos englobam o controle da dor, modulação imunológica, efeitos anabólicos nos tecidos ósseo, muscular e cartilaginoso, além da atenuação da fibrose por meio da inibição da proliferação de fibroblastos.
Os receptores CB2 são amplamente distribuídos em células do sistema imunológico, como macrófagos e células T, desempenhando um papel crucial nas respostas inflamatórias. A ativação desses receptores demonstra habilidade em reduzir a produção de moléculas pró-inflamatórias, como o fator de necrose tumoral alfa (TNF-a) e a interleucina-6 (IL-6), além de suprimir a infiltração de células imunes nas articulações. Os canabinoides também exibem efeitos imunomoduladores ao estimular a geração de células imunológicas anti-inflamatórias, incluindo as células T reguladoras.¹
Além disso, os endocanabinoides anandamida e 2-AG foram identificados no líquido sinovial de pacientes com OA e artrite reumatoide (AR), enquanto não foram detectados em voluntários saudáveis, sugerindo uma supraregulação do tônus endocanabinoide que poderia indicar um alvo terapêutico potencial para ambas as condições.²
O SEC é fundamental na modulação da dor e na manutenção da homeostase articular. Receptores canabinoides estão expressos em diversos tecidos articulares, incluindo condrócitos, osteoclastos, fibroblastos sinoviais e células imunes residentes e recrutadas. A ativação desses receptores tem demonstrado capacidade de inibir a liberação de mediadores da dor e reduzir a nocicepção articular. Adicionalmente, os endocanabinoides protegem contra a degradação da cartilagem ao suprimir a produção de metaloproteinases de matriz (MMPs) e promover a sobrevivência dos condrócitos.¹
Estudos realizados em modelos animais de osteoartrite revelam que, nos estágios iniciais da doença, os níveis de expressão dos receptores canabinoides TRPV1, CB1 e CB2, bem como de enzimas responsáveis pelo metabolismo da anandamida, estão aumentados. Esta elevação parece estar associada à resposta inflamatória inicial nas articulações afetadas, sugerindo implicações significativas no processo de desenvolvimento da dor crônica associada à OA.³
Evidências Clínicas
Em um estudo de 2018, foram investigadas as propriedades terapêuticas do CBD para o tratamento da dor associada à osteoartrite (OA), uma das formas mais prevalentes de dor crônica. A OA é conhecida por sua complexidade, envolvendo dor inflamatória, nociceptiva e neuropática, o que demanda uma abordagem terapêutica multifacetada. O estudo destacou que o CBD apresentou resultados promissores ao aliviar significativamente a dor causada pela OA, sugerindo seu potencial como uma opção terapêutica eficaz para melhorar a qualidade de vida de pacientes com essa condição debilitante.4
Veja et al. (2022) realizaram um ensaio clínico duplo-cego randomizado na Dinamarca para avaliar a eficácia do CBD isolado no tratamento da dor em 129 pacientes diagnosticados com osteoartrite de mão ou artrite psoriásica com dor moderada. Ao longo de um período de 12 semanas, os participantes foram divididos aleatoriamente para receberem doses diárias de 20 a 30 mg de CBD oral ou placebo. Os resultados do estudo revelaram que aproximadamente 20% dos pacientes em ambos os grupos experimentais experimentaram alguma redução na intensidade da dor. No entanto, não houve diferenças estatisticamente significativas na intensidade da dor entre o grupo que recebeu CBD e o grupo placebo. Os autores apontaram que a falta de uma titulação individualizada da dose e a manutenção de uma dose oral fixa relativamente baixa de CBD podem ter influenciado os resultados neutros observados neste ensaio clínico.
Conclusão
Com base nos estudos e evidências apresentados, fica claro que a cannabis, por meio de seus canabinoides e interações com o Sistema Endocanabinoide, emerge como uma opção terapêutica promissora no tratamento da dor associada à osteoartrite. Os canabinoides não só demonstraram eficácia no alívio da dor, mas também na modulação da inflamação nas articulações afetadas, oferecendo potencial para significativa melhoria na qualidade de vida dos pacientes. No entanto, é necessário conhecimento técnico aprofundado na área para estabelecer estratégias prescritivas individualizadas e assertivas, a fim de alcançar bons resultados. A WeCann desempenha um papel chave ao fornecer informações atualizadas e fundamentadas em evidências científicas qualificadas sobre cannabis medicinal, facilitando a implementação segura e eficaz dessa ferramenta terapêutica na prática médica.
Referências
- Kaur, I. et al. The endocannabinoid signaling pathway as an emerging target in pharmacotherapy, earmarking mitigation of destructive events in rheumatoid arthritis. Life Sci. 257, 118109 (2020).
- Richardson, D. et al. Characterisation of the cannabinoid receptor system in synovial tissue and Auid in patients with osteoarthritis and rheumatoid arthritis. Arthritis Res. Ther. 10, R43 (2008).
- Bryk, M. et al. Alterations in Anandamide Synthesis and Degradation during Osteoarthritis Progression in an Animal Model. Int. J. Mol. Sci. 21,738 1 (2020).
- O’Brien M, McDougall JJ. Cannabis and joints: scientific evidence for the alleviation of osteoarthritis pain by cannabinoids. Curr Opin Pharmacol. 2018 Jun;40:104-109. doi: 10.1016/j.coph.2018.03.012. Epub 2018 Apr 7. PMID: 29635215.