Caso Clínico: Doença de Parkinson e tratamento com cannabis medicinal

Publicado em 09/06/25 | Atualizado em 09/06/25 Leitura: 8 minutos

CanabinoidesCannabis como MedicamentoNeurológicas

Identificação

Paciente do sexo feminino, 64 anos, 65 kg, aposentada, com diagnóstico de Doença de Parkinson estabelecido em 2022. 

Apresentação do Caso Clínico

A paciente procurou atendimento médico com queixa principal de tremores limitantes, predominantemente no membro superior esquerdo, com início aproximadamente há 3 anos, apresentando piora significativa nos últimos 4 meses. Relata comprometimento importante das atividades diárias e pessoais.

Além dos sintomas motores característicos da doença de Parkinson, a paciente apresenta quadro de emagrecimento, perda de apetite, sono não reparador e ansiedade importante, que agrava os sintomas motores. O acompanhante relata que a paciente apresenta isolamento social significativo, tendo deixado de sair de casa por vergonha da dificuldade de se alimentar sozinha.

Paciente com Doença de Parkinson, com aparência cansada, feições tristes e expressão de ansiedade.
Paciente com Doença de Parkinson, com aparência cansada, feições tristes e expressão de ansiedade.

Estava em uso de Prolopa BD 100/25mg 4x/dia, Pramipexol 1g 1x/dia, Entacapona 800mg/dia (reduzida por conta própria para 200mg/dia devido a efeitos colaterais importantes) e Losartana 50mg 2x/dia para controle de hipertensão arterial.

Histórico Familiar e Hábitos de Vida

A paciente é aposentada e não pratica atividade física regular. Apresenta quadro depressivo e ansioso, com sono fragmentado, caracterizado por 4-5 despertares noturnos. Relata perda de apetite significativa.

Apresenta alterações gastrointestinais caracterizadas por diarreia e dor abdominal, com crises que duram de 3 a 4 dias. Nega histórico familiar positivo para condições clínicas demenciais.

Exame Físico

No exame físico, observa-se tremor de repouso mais acentuado no membro superior esquerdo. Apresenta sinais clássicos da doença de Parkinson: bradicinesia, rigidez muscular e instabilidade postural, além de alteração da marcha com passos curtos e arrastados.

Apresenta-se emagrecida, com sinais de desidratação leve. Pressão arterial dentro dos limites da normalidade (controlada com medicação anti-hipertensiva).

Paciente com Doença de Parkinson sendo avaliada durante consulta médica.
Paciente com Doença de Parkinson sendo avaliada durante consulta médica.

Exames Complementares

Foram solicitados exames laboratoriais gerais, que não mostraram alterações significativas. A polissonografia revelou quadro sugestivo de Apneia Obstrutiva do Sono, condição que pode estar contribuindo para o sono não reparador e agravamento dos sintomas de ansiedade.

Diagnóstico

A paciente apresenta quadro clínico compatível com Doença de Parkinson (CID G20), com manifestações motoras (tremores, bradicinesia, rigidez) e não-motoras (distúrbios do sono, sintomas gastrointestinais, ansiedade e humor deprimido). O diagnóstico foi estabelecido em 2022.

Como comorbidades, apresenta Hipertensão Arterial Sistêmica e Apneia Obstrutiva do Sono recém-diagnosticada.

Tratamento com Cannabis

Diante da persistência de sintomas motores e não-motores em uma paciente com Doença de Parkinson, mesmo sob regime farmacológico convencional, optou-se pela introdução da cannabis medicinal como estratégia adjuvante. O objetivo foi ampliar o controle dos tremores, da ansiedade e dos distúrbios do sono, promovendo melhora funcional e da qualidade de vida.

Proposta Terapêutica Inicial

Abordagem Farmacológica

A paciente fazia uso contínuo de Levodopa + Benserazida (Prolopa®) 100/25 mg, administrado 4 vezes ao dia, Pramipexol 1 mg, 1 vez ao dia, e Entacapona 200 mg/dia, além de Losartana 50 mg, 2 vezes ao dia para controle pressórico. 

Com a introdução da terapia canabinoide, foi prescrita uma formulação full spectrum rica em canabidiol (CBD), classificada como Tipo III, com concentração de 200 mg/mL, correspondendo a 1,35 mg de CBD e 0,05 mg de THC por gota. A administração foi feita por via sublingual, com titulação progressiva até a dose-alvo de 8 gotas a cada 12 horas, totalizando 21,6 mg de CBD e 0,8 mg de THC por dia. Os principais alvos terapêuticos incluíam tremores parkinsonianos, sintomas ansiosos e insônia.

Abordagem Não-Farmacológica

Paralelamente ao manejo farmacológico, foram implementadas intervenções não-farmacológicas, incluindo orientação nutricional com foco na recuperação ponderal, estímulo à atividade física leve e adaptada, acompanhamento psicológico, terapia ocupacional para suporte nas atividades de vida diária e fisioterapia motora.

Acompanhamento e ajustes

1º Retorno (Abril/2022)

No primeiro retorno (abril de 2022), a paciente relatou cefaleia e náuseas nos primeiros quatro dias de uso do extrato de cannabis, sem melhora significativa do sono ou tremores, embora com discreta melhora do trânsito intestinal. Os exames laboratoriais estavam dentro da normalidade e a polissonografia revelou apneia obstrutiva do sono, motivando a orientação para uso de C-PAP

Reforçou-se a higiene do sono e ajustou-se o esquema da cannabis, com recomendação para aumento gradual da dose de CBD e eventual introdução de formulação com maior teor de THC. A administração passou a ser feita 3 vezes ao dia, mantendo o óleo rico em CBD, e associou-se a melatonina noturna como auxiliar no sono.

2º Retorno (Fevereiro/2023)

No segundo retorno (fevereiro de 2023), observou-se piora clínica após 30 dias sem uso da cannabis. A prescrição do C-PAP foi mantida e introduziu-se uma terapia canabinoide dupla, composta por:

  • Óleo full spectrum rico em CBD, 8 gotas a cada 8 horas, mantendo a formulação de 200 mg/mL (CBD 1,35 mg/gota), total aproximado de 32,4mg CBD/dia;

  • Óleo full spectrum rico em THC (Tipo I), 5 gotas a cada 12 horas, com concentração de 300 mg/mL, correspondendo a 0,5 mg de THC por gota (total aproximado de 5mg THC/dia).

3º Retorno (Novembro/2023)

No terceiro retorno (novembro de 2023), houve relato de melhora clínica substancial, com ganhos no convívio social e redução significativa dos tremores, agora restritos a esforços intensos. Optou-se pela retirada da Entacapona, sem intercorrências clínicas imediatas, e manteve-se vigilância quanto à necessidade de ajustes futuros.

4º Retorno (Maio/2023)

No quarto retorno (maio de 2023), a paciente seguiu estável, sem agravamento clínico com a suspensão da Entacapona. A terapêutica com cannabis foi otimizada:

  • CBD: 10 gotas de 8/8h, atingindo 40,5 mg CBD/dia;

  • THC: 6 gotas de 12/12h, totalizando 7,5 mg THC/dia, ambos por via sublingual.

Evolução do Tratamento

A evolução clínica foi amplamente positiva. Houve melhora significativa dos tremores, redução da ansiedade e restabelecimento do sono reparador, sobretudo após o uso do C-PAP e ajustes precisos na dosagem dos canabinoides. A introdução da formulação rica em THC demonstrou papel fundamental no controle motor e nos distúrbios do sono. A retirada da Entacapona, sem piora sintomática, sugere um possível efeito compensatório promovido pela cannabis, destacando sua eficácia como recurso terapêutico complementar e adjuvante na otimização prescritiva.

O impacto mais notável, entretanto, foi observado na qualidade de vida: maior autonomia nas atividades diárias, redução do isolamento social e melhora do quadro ansioso-depressivo. Houve ainda benefícios secundários sobre o trato gastrointestinal, com melhora do apetite e do hábito intestinal.

Este caso clínico exemplifica o potencial da cannabis medicinal como intervenção adjuvante na Doença de Parkinson, especialmente em pacientes refratários ao tratamento padrão. A adequada seleção do tipo de formulação, titulação individualizada e integração com outras terapias foram cruciais para o sucesso terapêutico. Trata-se de uma alternativa que merece ser considerada e estudada com rigor pela comunidade médica, ampliando as fronteiras da terapêutica baseada em evidências.

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