A cannabis medicinal tem se consolidado como uma ferramenta terapêutica de crescente relevância clínica para diversas patologias, como epilepsia refratária, dor crônica, doença de Parkinson e transtornos de ansiedade. A base científica para sua eficácia continua a se expandir globalmente, impulsionando a flexibilização legislativa.
No contexto brasileiro, contudo, a despeito do reconhecimento pela Anvisa de suas propriedades medicinais, a democratização do acesso aos seus derivados ainda representa um desafio significativo para a saúde pública. Compreender os caminhos regulatórios e as vias de acesso é fundamental para o profissional que deseja oferecer essa modalidade de tratamento aos seus pacientes.
O primeiro e mais importante passo: a consulta médica
Antes de qualquer coisa, o ponto de partida é sempre uma consulta com um médico que tenha conhecimento e experiência no tratamento com cannabis medicinal.¹ Nosso papel é:
- Avaliar seu histórico de saúde e sua condição clínica.
- Determinar se a cannabis medicinal é uma opção de tratamento adequada para o seu caso.
- Definir o tipo de produto, a via de administração (como gotas, cápsulas, tópicos, etc.) e a dosagem correta.
- Elaborar a prescrição e o laudo detalhado, documentos essenciais para dar prosseguimento a qualquer uma das vias de acesso.
As 4 principais vias de acesso
Como médico, a sua prescrição é o ponto de partida para que o paciente tenha acesso aos produtos de cannabis medicinal. Dominar as vias regulatórias é essencial para garantir a segurança e a legalidade do tratamento.
A escolha da via de acesso é uma decisão clínica que o médico deve tomar em conjunto com o paciente. Conhecer as vantagens e desvantagens de cada opção é essencial para garantir a segurança e a eficácia do tratamento.
Produtos em farmácias
Esta via é baseada na RDC nº 327 da Anvisa e permite que produtos com registro ou notificação sanitária sejam adquiridos diretamente nas farmácias e drogarias brasileiras.²
- Vantagens: A principal vantagem é a segurança regulatória e a facilidade de aquisição. O produto é fiscalizado pela Anvisa, e o processo de compra é simples para o paciente.
- Desvantagens: A oferta ainda é limitada. O médico pode ter poucas opções de produtos para prescrever. Além disso, a prescrição exige o uso de receituário controlado físico, o que pode ser menos prático.
Para saber mais sobre os produtos aprovados pela Anvisa acesse: Cannabis medicinal e Anvisa: conheça os 35 produtos já registrados
Importando o medicamento
A importação é uma alternativa regulamentada pela RDC nº 660 da Anvisa, ideal quando o produto desejado não está disponível no Brasil.³
- Vantagens: O acesso a um mercado global oferece uma maior variedade de produtos e formulações, permitindo uma prescrição mais personalizada. O processo de autorização pode ser feito eletronicamente, o que simplifica o fluxo de receituário digital.
- Desvantagens: A imprevisibilidade da logística de importação pode causar atrasos. O médico também precisa ter conhecimento técnico aprofundado para avaliar a qualidade e a segurança do produto, já que ele não é diretamente fiscalizado no Brasil.
Como funciona a importação?
- Autorização da Anvisa: Você deve solicitar a autorização de importação pela internet, no site da agência. Basta preencher um formulário eletrônico e anexar a prescrição e o laudo médico. A análise costuma levar cerca de 10 dias.
- Compra e envio: Com a autorização em mãos, você pode comprar o produto de um fabricante ou distribuidor internacional. É importante considerar os custos de envio e os trâmites burocráticos.
Associações de pacientes
Algumas associações de pacientes operam com base em autorizações judiciais para cultivar e produzir derivados de cannabis.
- Vantagens: Muitas associações oferecem maior variedade de formulações e um custo mais acessível, tornando o tratamento viável para pacientes de menor renda. O sentimento de pertencimento a uma comunidade também é um benefício social.
- Desvantagens: A falta de regulamentação e padronização é um desafio. Os produtos podem variar em concentração e pureza, o que exige que o médico tenha conhecimento técnico para avaliar a qualidade e a segurança do produto, já que não há a supervisão de um órgão sanitário.
Acesso pelo SUS e planos de saúde
É fundamental que o médico compreenda o caminho para que o paciente obtenha o tratamento por meio do Sistema Único de Saúde (SUS) ou de planos de saúde. Embora esse seja um direito, o processo demanda uma abordagem administrativa e, em muitos casos, judicial.
- Processo no SUS: Para iniciar, o paciente precisa de uma prescrição médica e de um relatório clínico detalhado. Com esses documentos, o processo administrativo deve ser protocolado na Secretaria de Saúde local. Uma vez aprovado, o medicamento é fornecido gratuitamente.
- Cobertura por Planos de Saúde: A ausência do canabidiol no Rol de Procedimentos da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) não impede o acesso. O médico pode auxiliar o paciente na solicitação formal ao plano de saúde. Em caso de recusa, o Poder Judiciário tem sido um recurso eficaz para garantir a cobertura do tratamento.
Conclusão
O acesso à cannabis medicinal no Brasil, embora em evolução, ainda se depara com barreiras significativas, que podem ser de ordem regulatória, econômica ou burocrática. Como profissionais de saúde, nosso papel é fundamental para orientar os pacientes sobre as vias de acesso legais e seguras.
A escolha da melhor via de acesso dependerá de uma avaliação criteriosa do caso clínico, das necessidades do paciente e das suas condições socioeconômicas. Ao dominar o processo e conhecer as alternativas disponíveis, o médico está mais preparado para garantir que o paciente tenha acesso a essa importante ferramenta terapêutica.
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O domínio sobre o processo regulatório e a compreensão das alternativas disponíveis, desde a compra em farmácias até o acesso por vias judiciais, não é apenas um conhecimento administrativo, mas uma competência clínica essencial. Ela nos capacita a garantir que o paciente tenha acesso à ferramenta terapêutica de que necessita, respeitando as normativas vigentes e, acima de tudo, priorizando sua saúde e bem-estar.
Neste cenário, a WeCann surge como uma aliada estratégica da comunidade médica, oferecendo formação baseada em evidências e ferramentas práticas para integrar o conhecimento sobre cannabis medicinal à prática clínica. Entre esses recursos, destaca-se o Tratado de Medicina Endocanabinoide, como uma referência técnico-científica internacional, fornecendo o conhecimento necessário para abordar desde as indicações clínicas complexas até os aspectos regulatórios.
Se você é um profissional da saúde que busca atuar de forma ética, atualizada e centrada no paciente, o acesso ao Tratado de Medicina Endocanabinoide é um passo decisivo para transformar sua abordagem terapêutica.
Referências
- Conselho Federal de Medicina (CFM). (2021). Diretrizes para prescrição de canabinoides. Disponível em: www.portal.cfm.org.br.
- BRASIL. Ministério da Saúde. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Resolução da Diretoria Colegiada – RDC nº 327, de 9 de dezembro de 2019. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 11 dez. 2019. Seção 1, p. 194.
- AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA (Brasil). Resolução de Diretoria Colegiada – RDC Nº 660, de 30 de março de 2022. Dispõe sobre a simplificação de procedimentos para a importação de produtos de cannabis para fins medicinais. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 31 mar. 2022.